terça-feira, 23 de abril de 2013

Incoerências: Dia Mundial do Livro e feiras do livro

(desconheço o autor desta bela ilustração..."pescada pela Net)
Como se costuma dizer, um livro é uma excelente companhia, pode ser um bom amigo, não ocupa muito espaço nem pesa assim tanto, pode ser lido em qualquer recanto-- e aos poucos-- e transporta com ele, não só as palavras que se fazem histórias ou relatos de saber, mas o pensamento do ser Humano, para lá do Tempo e das fronteiras político-geográficas.
Serve isto para lembrar que hoje se comemora o Dia Mundial do Livro. Mesmo quem não costuma ler muito, hoje deveria passar por uma livraria, passar umas horas numa biblioteca, ou, ao menos, pegar naquele livro há tanto tempo guardado numa estante da casa, à espera de mais vagar da nossa parte para ser lido.
Lembro que o melhor exemplo que nós, adultos, podemos dar às crianças e jovens  sobre a leitura, não é simplesmente mandá-los ler, mas lermos também. Uma criança que vê o pai ou a mãe a ler, ao serão, desenvolve mais depressa o gosto pela leitura do que se "apenas" tiver o incentivo à leitura na sua escola.
Pena que Rui Rio e a sua Câmara do Porto não tenha entendido também essa dimensão, que é a da tradição do livro em espaço público, que é a de uma cidade que ao menos anualmente festeja o livro, ao não apoiar, este ano, a Feira do Livro do Porto, que já ia em mais de 80 anos consecutivos. Pode ter razão , a Câmara, quando alega a crise e falta de dinheiro para não poder dar grande apoio pecuniário à feira, para além do que se propunha facultar (limpeza, vigilância e cedência do espaço-- na av. dos Aliados-- e outras condições logísticas). Terá apenas alguma razão, porém, a alegar que a Feira é uma intervenção de Privados, com fim comercial e que a Câmara não tem mais obrigações do que as que queria este ano oferecer.
Nesse caso, pergunta toda a cidade, porque continua a apoiar todos os anos o Red Bull air Race ou as corridas de automóveis na Boavista, muito mais caras ao erário da autarquia e que, no caso das corridas, implicam a montagem de bancadas em terrenos públicos, o condicionamento do trânsito (o que a Feira do Livro não faz) e a nova e anual repavimentação de parte da Avenida da Boavista, para garantir a perfeição do piso para os automóveis em exibição? São esses eventos totalmente públicos? Não. São para lucro e promoção de privados ? Com certeza (até cobram bilhetes, mesmo estando a ocupar e a perturbar, em trânsito e ruído o espaço que é de todos)! Saem mais baratos? Nem de longe! São muito mais caros para a CM do Porto.
É portanto má vontade da CMP e parece esta medida inédita querer comprovar o que se diz de Rui Rio, que despreza tudo o que diz respeito à Cultura e que opta pelos seus próprios gostos e paixões (corridas de automóveis, eventos de luxo e de encher o olho), mesmo que com muito menos tradição, apesar de --mas mais nos anos iniciais, pela novidade--, terem  a  curiosidade e a adesão populares. 
Pode a APEL ter culpas, ao querer pedir mais do que a CMP pode dispor monetariamente, mas a CMP deveria contribuir com alguma quantia, como costume. Deveriam ter chegado a um acordo, pensando acima de tudo nos cidadãos. A Feira do ano passado já estava bastante pobre, mas  mesmo assim marcava uma presença do livro na cidade e, enquanto os cidadãos, a empobrecer de ano para ano, ali passavam a comprar livros novos ou pechinchas em segunda mão, ou pelo menos os iam folheando e lendo aos poucos, tinhamos, no coração da cidade, alguns dias em que o livro era rei e em que o saber e espírito Humano  lembravam aos cidadãos que nem tudo é feito de números e da vil economia-excel.
Tal como o pai, lendo ao serão, dá o exemplo ao filho, deveria a Câmara dar o exemplo aos seus cidadãos de que não despreza o livro. E esse exemplo seria mais rentável para a Cultura do Porto e da Humanidade em geral que os escassos milhares de euros que o executivo de Rui Rio se visse "obrigado" a desembolsar/investir, em mais uma edição ds Feira do Livro do Porto (assim se menorizando a cidade, mais uma vez, perante a capital do País, à conta de um autarca meramente... forreta que, apesar de ser um gestor basicamente honesto, insiste em se mostrar preconceituoso e de espírito tacanho).
À falta de livros no coração da cidade, prestemos nós, cidadãos, um tributo ao livro, lendo  hoje (ao menos um capítulo de) um à nossa escolha.
Não deixemos que, ao ignoramos também os livros, estes se tornem cegos, mudos e surdos, vocação que não é a sua, ironizada pelos livros "abandonados" da ilustração acima.
Margarida Alegria (23-4-2013, in blog "Alegrias e Alergias")

ADENDA:
Já depois de escrever este post, soube que está a ser organizada, via Facebook,  uma manifestação para exigir a realização da Feira do Livro do Porto (seria a 83ª). Será na próxima sexta-feira, dia 26 de Abril, às 18 h, na Praça da Liberdade (Porto). A dinamizadora é Ana Maria Pinto, a jovem cantora lírica portuense que se tornou famosa com os solos do "Acordai" do Lopes-Graça, em manifestações como a  que decorreu junto a Belém e também no dia 5 de Outubro. No passado dia 2 de Março, na Manifestação "Que se lixe a Troika", na Invicta, foi ela que guiou o entoar de vários hinos e canções, desde o "Maria da Fonte" ao "Grândola" final, passando por muitos outros temas. Apenas com um pequeno megafone a auxiliar, foi incansável! Foi um dos momentos marcantes da manifestação, em todo o desfile desde a Praça da Batalha à Praça da Liberdade, algo que jamais esquecerei, pois conseguiu dar ânimo a tantos que estavam ali em profunda revolta triste, conseguindo pôr quase todos a cantar ao longo de um bom par de horas . Daquela forma sublinhou  ainda melhor a dignidade da ocasião e  a força do sentir que motivava os cidadãos que ali fizeram questão de comparecer. Comovente e... soberano! Obrigada, Ana Maria.

2 comentários:

  1. Respostas
    1. Desculpa, Valsita, só agora pude responder.
      É bom saber que as nossas palavras não caem no vazio de uma vasta blogosfera.
      Mas que seja para contribuir um pouco para a divulgação e a defesa da cultura, já que em pouco mais podemos ter verdadeira voz...
      Beijinho.

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