quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Sinceridade?! (Um Louco Pré-Natal 2)

Voltando, como prometera, ao caso sumarento da entrevista do Primeiro-ministro e aos seus conselhos, tanto a professores desempregados como a outra mão-de-obra qualificada, que analisei no meu post anterior (AQUI), quero agora acrescentar mais algumas pontas soltas que ficaram, assim como alguns argumentos dos que vieram à praça, blogosférica ou televisiva, em defesa da interpretação mais branqueada das palavras de Passos Coelho.
Em síntese e generalizando um pouco, os argumentos principais de defesa da famosa "gaffe"(?) do PM são os seguintes:


1- Afinal PPC apenas disse o mesmo que toda a gente diz em casa, aos filhos, aos amigos, é normal. Não há nada demais em aconselhar as pessoas a emigrar. A situação está má,há muito desemprego em Portugal mesmo ou sobretudo para os jovens mais qualificados;
2-Estão a fazer uma tempestade num copo de água; a frase foi descontextualizada, PPC falava de conversas tidas com a "presidenta" Dilma e o presidente de Angola, foi um "fait divers".


Nota ao argumento 2: Ressalve-se que hoje mesmo o próprio PPC (!!!)veio com esse argumento de auto-defesa, como se não falasse de algo que ele próprio disse. Ou seja, sem um único esboço de pedido de desculpas e vendo que os seus defensores ainda haviam agravado a polémica, com a fraca e até disparatada argumentação apresentada, PPC diz que não se deve perder tempo a discutir coisas pequenas, falhas pequenas, pois há objectivos maiores a encarar, a tal coesão nacional ( a que apelou o PR, por exemplo), para desígnios comuns ( só faltava falar dos "amanhãs que cantam").


3-Finalmente, o argumento máximo de ricochete é aquele que assume que quem critica as palavras do PM é porque defende o anterior, Sócrates de má memória e resume-se assim:"O que é? Preferiam por acaso que PPC fosse mentiroso como o outro?! Ao menos este diz as verdades! É muito sincero! Criticam alguém por ser sincero»!"

(Há um quarto argumento: o de que já há poucas crianças e há professores a mais, completamente fora da realidade, mas deixarei esse para outra ocasião).

Uma rápida resposta aos dois primeiros argumentos (poderei desenvolver mais tarde, pois este tema ainda vai dar para mais uns 3 posts. Já estão planeados):

R1- (Este argumento já analisei antes mas vou voltar á carga) É claro que em conversa de família, de café e blogues as pessoas falam da hipótese de emigração para melhorar o futuro. Aconselham filhos e vizinhos. Mas PPC não estava em conversa de café, nem com os amigos: é o PM, o responsável máximo do governo, alguém que deve ter uma visão global para o futuro do país e não um funcionário de cartório para fazer inventário e cobrar penhoras. Alguns comparam o discurso da crise como o criar de uma pausa num jogo de futebol, até se poder jogar bem de novo. Discordo: não é hora de descansar. E se o país é uma equipa, todos devem ser treinados e incentivados, mesmo os que têm de ficar no banco algum tempo, E o PM não é um árbitro que pára o jogo, nem muito menos um relatador de bancada, a dizer que o jogo está perdido e a equipa não tem hipóteses. O PM deve ser o treinador, que sabe criar "espírito de corpo" em todos. E falar para os OCS é falar para todo o país. Não basta apelar ao bem comum quando há discursos oficiais.

R2- Falar da missão de um chefe de governo NÃO é um "fait divers". Antes pelo contrário.Se o assunto era só um detalhe lateral na entrevista, já deveria saber que não poderia generalizar assim. Então em Campanha eleitoral fala em Futuro melhor e desígnios nacionais (os tais que agora retoma, fingindo optimismo para salvar "a coisas") e fala do destino de milhares de portugueses e de uma opção seriíssima e gigantesca que é emigrar, largar o país , os seus , as raízes, como se fosse uma coisa banal?! Era uma mera hipótese académica?! Votamos à tal conversa de café? A vida inteira das pessoas, a sua mudança total e a violência de adaptação de jovens sem cunhas e de pessoas já com família... é um... pormenor?" Um detalhe?". E o arremedo de hoje também foi mais um tiro no próprio pé, mostrando que o tal sincero e verdadeiro não se digna a pedir desculpa por ter generalizado, por ter dado tal conselho. E por, ao parecer esquecer o seu papel de motor central do país nessa(s) entrevista(s), ter transmitido a mensagem subliminar: "atenção, povo! Estamos por um fio e tramados! Salve-se quem puder. Emigrem. Cá não há lugar para vós! Borda fora! Rua!". Conversei com diversas pessoas de várias condições. Foi ESSA a mensagem que passou! E começo até a achar que é essa a intenção comunicativa, pois como temos visto com as medidas, têm usado as mesmas técnicas de alarmismo que usava o governo de J. Sócrates (anunciar que cortam 100, depois afinal não é bem assim e depois cortam 99 para o país suspirar aliviado e encolher ombros).E não é que poucos dias depois lá vêm medidas adicionais e de exploração laboral? parecem piores, mas afinal dois dias antes o PM mostrou a hipótese que mais receariamos: ou aceitarmos mais apertos, ou emigramos para lugares inseguros e ainda mais precários.

R3- Quanto à questão da "sinceridade", de dizer a verdade: é certo que ficámos a detestar pinóquios, mas até disso o nosso PM não pode sair ileso, pois já contrariou, em seis escassos meses, tudo o que prometeu em Campanha Eleitoral, reforçando o descrédito dos políticos junto da população e de quem nele confiou, como menino de coro sincero. Já perdeu ese crédito. E uma coisa é dizer a Verdade aos portugueses, outra é ser desanimador e alarmista no cargo que tem. Além do mais, a questão da Verdade ainda está mal contada, pos até ao momento nem sabemos a quem é que devemos de facto, e quanto (sem ser com buracos colossais, em cada km avançado), quem são os responsáveis mais directos pelos rombos e como lhe estáa ser cobrada a ELES a indemnização pelos danos. E resta pensar ainda no que se fala quando se menciona a SINCERIDADE dos políticos. Será como este cartoon que aqui mostro a seguir? Qualquer verdade serve? Como a daquela mãe que na rua chama "seu filho da P.*!" ao próprio filho, toda cheia de "sinceridade"?



Depois, ao ver tantos blogueiros e comentadores alaranjadamente a defender a virtude da "Sinceridade" como bem absoluto e panaceia Universal, comecei a tentar lembrar-me onde surgira essa praga do "ser sincero"= ser "à bruta". E lembrei-me: há uns anos havia a febre do primeiro "Big brother" em Portugal. Mesmo tentando dissuadir os alunos de ver esse tipo de "programas", o assunto vinha sempre à baila a propósito para tudo. Em tudo queriam falar do que viam, Redacções, comentário de textos, actividades extra-curriculares...Houve duas expressões que vieram para ficar desde então, para nosso mal: o "estarmos dentro da casa 24 sobre 24 horas" (expressão de cariz Científico-matemático que redundava num vazio Lapalisseano saber) e... o "ele/ela é bruto/a mas é SINCERO". O ser sincero parecia tornar-se assim no ser-se um grunho desbocado e violento, que não sofrera polimento dos pais, mas que no fundo era um bom selvagem! E era preciso rebater essa imagem distorcida e fazer ver aos alunos que uma coisa era ser-se mentiroso ou hipócrita(algo negativo), outra era confundir sinceridade com crueldade, irritação e precipitação, o mandar àquela parte outros seres humanos por todo e qualquer razão, só porque se acordou maldisposto e o "ser-se mesmo assim com mau feitio" ser uma inevitabilidade que não se pode modelar com tolerância e a voz da consciência. Como que se o nascer bruto e impulsivo fosse inevitável e marca para toda a vida, não havendo as partes comuns de boa convivência que nos devem ajudar a auto-regular e controlar os "humores". No fundo, numa cultura que, endeusando o corpo e a aparente espontaneidade, desprezava a cortesia e a decência como algo de nocivo ao culto do EU, então em crescendo. Uma sociedade a criar narcisistas, em suma. Com o acrescento espúrio de, sabendo que eram filmados, serem ainda mais brutos e mais "sinceros", a bem das audiências que gostam de pão e circo.



(após um famoso pontapé de um concorrente a uma colega, só porque se irritou com uma agressão verbal. Ou seja, as bravatas de taberna levadas ao rubro perante milhões. E tanto bom actor no desemprego. Mas era a tal pseudo-sinceridade impulsiva a reinar.)


Voltando ao PM e seus defensores. Afinal, o que interessa é que foi "sincero", dando um "pontapé na cara" das pessoas mais qualificadas no país, um recado "sincero" e amigo, a tentar "pontapear" pessoas para fora do país, pelo insulto que foi gastarem tanta verba do PIB (os números do custo de cada aluno vem sempre à baila, como se fosse um mero automóvel a gastar X de gasolina e manutenção) para se formarem! Um pontapé metafórico, mas sentido como pontapé por pessoas que andam há anos e décadas a ensinar com contratos a prazo para o próprio Estado, mão-de-obra qualificada e barata a assegurar as muitas necessidades de docentes pelo pais fora. Pessoas que já há muitos anos andam fora das famosas "zonas de conforto", pois percorrem o país, ano após ano, de "casa" às costas, separando-se já da família, muitas vezes, Vidas duras. Mas vai o jovem governante, sempre amparado, e, do cimo da sua "sinceridade" eleita, aconselha à "simplicidade" da emigração. Não foi bonito. Não foi nem boa ideia para quem falou, nem para aqueles a quem "aconselhava" ,qual Marcelo Caetano em "Conversas em Família" (esse menos sincero, mais sinuoso). Nem foi uma boa ideia como solução para o país. Tentar esvaziá-lo não aumenta a produtividade almejada nos designios comuns. Nem "universalistas", lembrando a argumentação infeliz do ministro Relvas.Outros países agradecem tanta oferta de gente já pronta a trabalhar. E Portugal? E...nem sequer foi Verdade. Pois até acabara de mandar regressar professores a trabalhar no estrangeiro! E não tinha qualquer plano de apoio para tal emigração: não se pode aconselhar alguém em público para ir pedir ajuda ao país vizinho sem antes perguntar ao país vizinho se está disposto a acolher. África , Brasil, Timor, não ficam ali já à esquina, com "pensões Avenida" (ou sequer meros CONSULADOS) em cada quarteirão...


Para terminar, deixo o mimo desta foto, que mais uma vez comprova que dizer certas "verdades" pode criar certo alarmismo, embora pareça prático e cómodo para o próprio! :))
Ora leiam lá a camisa!


"Alergia" (21-12-2011)


(continuarei o tema e seus colaterais noutros posts- como a Parte 3 AQUI)

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