quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

"Desinaugurar" Portugal (Um Louco Pós- Natal 2)

Eu bem queria que quem nos desgoverna me deixasse tempo para acabar os textos da série "Um Louco Pós- Natal", baseados ainda na nova teoria de emigração de Passos Coelho e Miguel Relvas na famosa entrevista e depoimentos vários. Mas não: cada cavadela, cada minhoca, como se costuma dizer. Todos os dias, a quase todas as horas, saltam para a ribalta mais personagens pitorescas para nos assegurar, em forma vagamente humana, que Portugal está mesmo entregues "aos bichos". Vou portanto alterar o rumo de um dos rascunhos e transformar este texto no "Louco Pós-Natal parte 2". No fundo, são confirmações do que já planeava dizer.

Primeiro, surge a desumanidade da opinião de Manuela Ferreira Leite, ontem. A senhora, uma septuagenária (atente-se!)normalmente sensata, alega que os portugueses com mais de 70 anos deveriam pagar do seu bolso as hemodiálises (que custam cerca de 500 Euros cada uma)! Não sugeriu aos septuagenários da nossa élite política que abdicassem de alguns dos seus 500€ X muitos dos seus salários e benesses, ou reformas douradas, para financiarem boas centenas de diálises de muitos concidadãos. Não! A sua triste lógica é: ter chegado aos 70 anos já é uma sorte, esses hemodialisados anciãos são um peso para o Estado, por isso escolham pagar ou deixem-se morrer e não aborreçam mais o SNS. Lógica em segundo plano: se tiveres dinheiro, tens direito a cuidados de saúde. Se não o tiveres, azar o teu!

Pergunte-se à senhora: afinal para que são os descontos obrigatórios para muitos subsistemas de saúde e para que servem os impostos que pagamos? Deveriam para assegurar ao menos estes três aspectos: pagar as estradas e as ruas onde circulamos(para o trabalho, por exemplo...), a Educação que nos leva mais longe nas "estradas" da Vida e a Saúde que nos ajuda a poder apreciar e assegurar ambas as "caminhadas". Razão têm as associações de hemodialisados ao exigirem as desculpas de MFL! O cidadão parece agora reduzido ao seu papel de produtor/não produtor e encarado como "gordura" por este desumano sistema neoliberal que se vem depressa instalando no nosso Estado e em certas cabeças acéfalas, mas isto é demais! Que não vá para a frente a lei da Eutanásia, senão a terceira Idade ficará (ainda mais) tramada! Ou pelo menos, uma certa 3ª Idade, a não bafejada pelo acumular de pensões vitalícias e doiradas.

Segundo facto: hoje, em Palmela, foi desligado o primeiro dos vários Emissores analógicos de TV, no avançar da última fase da substituição da rede analógica pela TDT.

Foi emocionante escutar o relato transmitido pela TSF (escutar AQUI... !), onde o sempre voluntarioso ministro Relvas apelou a um tal engenheiro Paulino para que procedesse ao corte. Fê-lo por videoconferência(com muito ruído electroestático!), julga-se que em TDT, e o seu apelo é realmente de entusiasmar o patriota que há em cada um de nós! :))

Por sua vez, outro "cromo" do humor (ainda um tanto analógico) e da tecnologia, o presidente da ANACOM (Autoridade Nacional de Comunicações...aquilo que serve para...hã... coiso... quer dizer... enfim, tachos...) declarou todo pimpão que aquele evento deveria ser considerado uma "Desinauguração" (do Analógico), pois a TDT já havia sido iniciada há bastante tempo. Foi lindo!

O certo é que esse neologismo usado por Amado da Silva, se só terá provocado um sorriso amarelado aos circundantes e a paródia sibilina dos locutores da TSF, ao menos deu para atribuir um nome ao tema que eu queria desenvolver neste texto.

Por um lado (e bem sei que A. Silva se referia ao encerrar do analógico), fugiu-lhe a boca para a verdade: no fundo, os nossos Governantes e seus organismos satélites só encerram ou observam e fazem relatórios, nunca dando nada a ninguém. O mesmo A.S. explicava há pouco que o nosso TDT estaria peparado para uns 7 canais de TV e com o tempo ficaria apto para 14 (ao perguntarem-lhe porque não tinhamos 14, ou 30 ou mais canais em TDT, como outros países, totalmente grátis para os cidadãos). Argumentava que para já só poderiam ser os 4 canais que tinhamos analógicos ( a justificação foi vaga e esfarrapada), mas que para futuro, quem sabe... Não , não dão nada a ninguém... solidifica as já grandes suspeitas de muitos de que os futuros 10 canais extra serão em troco de alguma taxa mensal, a pagar à PT a quem foi entregue o negócio, escandalosamente!

Por outro, este novo termo confirma o que os desgovernantes dos últimos anos têm feito, começando em Sócrates e continuando em Coelho e Relvas, incluindo até muitas das acções de desmantelamento da nossa economia nos anos 90 áureos da entrada na CE(E), por Cavaco Silva, o que eles têm vindo a fazer, dizia eu, é a verdadeira DESINAUGURAÇÃO de PORTUGAL.

Cavaco desinaugurou a Agricultura e as Pescas, em troca de umas estradas onde melhor pudessem entrar os produtos espanhóis , franceses e alemães.

Sócrates desinaugurou maternidades e serviços de urgência. Depois, com ajuda de MLR, desinaugurou milhares de escolas rurais,algumas delas recentemente restauradas(e pelos próprios pais!), concentrando os ensonados pequenos em "caixotes escolares" e tendo em mira a destruição da Escola pública e futuras privatizações, alegando dar em troca a "banda larga" (pífia, como se verificou), umas lancheiras de nome "Magalhães" (que duraram ainda menos que a viagem de circumnavegação do seu "padroeiro") e uma suposta melhoria de instalações, incluindo ginásios que em muitos casos ainda faltam.

Agora Passos Coelho continua a obra de desinauguração, levando essa miséria não só ao sector público como à iniciativa privada, onde ela existia. Desinauguração de mais escolas, de mais hospitais, de serviços fundamentais para os cidadãos (enquanto continuam a não desinaugurar tantas PPP, IP, comissões e outro tachos). Não vejo mal em acabar com o Observatório da Violência nas Escolas (que pode ser levado a cabo por tanta gente que enche o MEC na 5 de Outubro), , mas os tachos nas dres continuam, só para dar um exemplo. Desinauguração, sobretudo dos DIREITOS dos cidadãos consagrados na Constituição e desinauguração dos SALÁRIOS como fonte de sobrevivência digna, através de cortes (leia-se roubos) de subsídios que compensavam o baixo nível dos mesmos , de cortes em percentagens cada vez mais substanciais dos 12 salários anuais, aumento brutal de impostos e de despesas (energia, transportes). Desinauguração de empresas nacionais de valor para todos e a custo sobreviventes, como a CP, a TAP, os CTT e todas aquelas que tencionam desinaugurar junto de chineses e outros compradores.

Nas pequenas e médias empresas, dando apenas uma vista de olhos no meu bairro, já consigo contabilizar, pelo menos, a DESINAUGURAÇÃO de uma papelaria/tabacaria, três ou quatro restaurantese/ou cafés, um talho, duas mercearias e dois cabeleireiros. Ah e até uma loja chinesa(sem quaisquer familiares a render a guarda)!

Na sua famosa entrevista já aqui analisada em quatro textos (sendo este o quarto e faltando um), o Primeiro -Ministro PPC veio, finalmente, desinaugurar a desinaguração a seguir planeada: o desinaugurar dos portugueses como habitantes de Portugal, aconselhando quem tem habilitações (ou não) a emigrar. Ficará o país para alguns turistas de luxo, para pessoas na miséria que os sirvam, para velhos a morrer sem apoios de saúde (nem sequer hemodiálises!) e de qualidade de vida e para os que para cá imigraram e não quiseram ou puderam voltar às suas terras, muitas vezes optando pela via do banditismo, pois os seus empregos também foram "desinaugurados"!

A única coisa que continuam a inaugurar em força são os tachos para os amigos, as prebendas, os favores políticos , aventalados ou não.

Bem pode o ministro Álvaro, da Economia, apregoar as qualidades do pastel de nata português ou do churrasco do "Nando's"(África do Sul, ai de novo o conselho à emigração). Portugal desinaugura-se dia-a-dia e não tarda fecha, com uma tabuleta a disfarçar, alegando "encerrado para obras, devido a ... desinauguração".

(sobre a palestra "empastelada" falarei a seguir).

"Alergia" (12-1-2012, in blog "Alegrias e Alergias")

Sem comentários:

Enviar um comentário